Carolina Uzeda*
Dia 1º. de agosto, se tudo ocorrer como esperado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por sua Corte Especial, tomará uma decisão que definirá os rumos que o processo civil brasileiro trilhará nos próximos anos. Pelo menos com relação à recorribilidade das decisões interlocutórias e à possibilidade de interpor agravo de instrumento, mesmo em hipóteses não previstas expressamente no art. 1.015 do CPC.
Serão julgados os Recursos Especiais números 1696396/MT e 1704520/MT, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, cuja questão submetida a julgamento, pelo regime dos recursos repetitivos, é “Definir a natureza do rol do art. 1.015 do CPC/2015 e verificar a possibilidade de sua interpretação extensiva, para se admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente versadas nos incisos do referido dispositivo do Novo CPC”.
O Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) ingressou no feito como amicus curiae e dividiu sua manifestação em duas partes: uma favorável e outra contrária à ‘interpretação extensiva’ do art. 1.015[i]. Apresentou as principais controvérsias da doutrina sobre o tema e encerrou ressaltando a relevância da modulação dos efeitos da decisão do recurso repetitivo:
“4.5. O que se almeja é que a futura orientação a ser consolidada seja aplicável a todas as decisões interlocutórias proferidas a partir da data da publicação do acórdão nestes autos, assegurando:
- a) caso a decisão seja pela ampliação, por “interpretação extensiva”, do rol do art. 1.015, o julgamento do mérito dos eventuais mandados de segurança pendentes, assegurando-se, ainda:
a.1) que a admissão do agravo de instrumento por “interpretação extensiva” não afasta o direito de a parte, alternativamente, de impugnar as decisões interlocutórias recorríveis por apelação ou em contrarrazões de apelação, nos termos do § 1º. do art. 1.009, não configurando preclusão a não interposição de agravo de instrumento contra qualquer decisão interlocutória, salvo aquelas previstas de forma clara e taxativa no art. 1.015 do CPC; ou,
a.2) o direito de impugnação, em sede de recurso de apelação ou em contrarrazões nos termos do §1º. do art. 1.009, de todas as decisões interlocutórias até então irrecorríveis por agravo de instrumento e proferidas antes da data da publicação do acórdão.
- b) caso a decisão seja no sentido de que o rol de hipóteses de cabimento do agravo de instrumento previsto no art. 1.015 do CPC é realmente taxativo e que não contempla qualquer ampliação por “interpretação extensiva”, o julgamento do mérito de todos os agravos de instrumento pendentes e interpostos contra decisões interlocutórias que foram impugnadas com fundamento na tese da “interpretação extensiva” do rol do art. 1.015.”[ii]
A Professora Teresa Arruda Alvim, indicada pelo IBDP para realizar a sustentação oral na sessão de julgamento da próxima quarta-feira, já havia manifestado preocupação com relação à modulação[iii], especialmente para que os recorrentes não sejam prejudicados em razão da insegurança jurídica provocada pela controvérsia doutrinária e jurisprudencial:
“Qualquer que seja a posição tomada pelo STJ, nesta ocasião, é relevante que haja modulação. De fato, a insegurança causada pela doutrina/jurisprudência que adotam a tese da possibilidade de interpretação analógica (diferente da extensiva) gerou e vem gerando situações perigosas. Imaginemos o exemplo da competência: não se agravou, deixando-se para impugnar a decisão apenas na apelação. Quando do julgamento da apelação, o tribunal se manifesta no sentido de que o agravo deveria ter sido interposto, por ser, a interpretação analógica, imprescindível.
Admitir o agravo em situações como a de que acima se tratou, significa não admitir sua impugnação na apelação em contrarrazões.
Portanto, em situações ocorridas antes da decisão dos repetitivos, deve-se considerar certa a opção do tribunal a quo, que não teria prejudicado o recorrente, qualquer que tenha sido ela.”
Em todo caso, independentemente da modulação realizada, fato é que, certamente, todos teremos que seguir a tese fixada pelo STJ. Caso a Corte decida pela interpretação extensiva ou até mesmo pela analogia, as partes deverão ter a cautela de verificar se é possível interpor o agravo de instrumento, considerando os parâmetros estabelecidos no acórdão, sob pena de preclusão do direito de recorrer, caso aguardem a interposição do recurso de apelação para formularem seu recurso em preliminar de razões ou contrarrazões[iv].
É importante ter em mente, ainda, que a tese fixada terá efeitos imediatos. Ou seja, não é preciso aguardar o transito em julgado da decisão do STJ para que a tese passe a ser aplicada em todos os tribunais. Tão logo publicado o acórdão, a decisão atingirá a todos e definirá como a advocacia e o Judiciário se comportarão diante das decisões interlocutórias não previstas expressamente no art. 1.015.
[i] Também foram deferidas as intervenções da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPRO) e da Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo (ANNEP).
[ii] A petição foi assinada por Paulo Henrique dos Santos Lucon, Paula Sarno Braga e Luiz Henrique Volpe Camargo.
[iii] Um agravo: dois sérios problemas. Disponível em http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI281602,91041-Um+agravo+dois+serios+problemas, acesso em 30.07.2018.
[iv] Sobre o recurso contra decisões interlocutórias não agraváveis, vide: UZEDA, Carolina. Interesse recursal. Salvador : Juspodivm, 2018.
* Carolina Uzeda é Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Carioca de Processo Civil e da Comissão Especial de Análise da Regulamentação do Novo Código de Processo Civil do Conselho Federal da OAB. Advogada no Arruda Alvim, Aragão, Lins & Sato Advogados.