Carolina Uzeda[1]
Em 06 novembro de 2018, o STJ afetou o Tema 1000. Por uma intervenção do destino, o milésimo repetitivo a ser julgado pela Corte versa sobre direito processual, especificamente sobre o CPC de 2015.
O Recurso Especial de n. 1.763.462/MG discute a aplicação do Tema 705, o qual consignou que não cabe multa cominatória na exibição, incidental ou autônoma, de documento relativo a direito disponível.
Mais uma coincidência feliz: o Tema 1000, a bem da verdade, discute o destino do Tema 705. Como o Tribunal entenderá o cabimento da multa para situações ocorridas na vigência da legislação de 2015.
Isto porque, o art. 400, parágrafo único, afirma expressamente, em sentido aparentemente contrário ao precedente, que “sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido”.
Diz-se aparentemente porque, como o próprio recorrente esclarece no recurso afetado, o art. 400, parágrafo único, exigiria o esgotamento da possibilidade de aplicação da presunção de veracidade. Além disso, apenas seria aplicável “em um quadro no qual resta comprovada cabalmente a existência do documento, seja pela ausência de negativa ou elemento dos autos, revelando-se inócua ou ineficaz a busca e apreensão ou presunção de veracidade”.
Há manifestação doutrinária em sentido semelhante, entendendo como eloquente a omissão do legislador quanto à possibilidade de, nestes casos, aplicar-se multa diária. Como defendem Teresa Arruda Alvim, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello:
“2.1. O incidente de exibição de documento ou coisa é meramente instrumental (não constitui um fim em si mesmo), voltado a demonstrar um fato tido por relevante à solução da lide. Assim, a “presunção” de veracidade desse fato, em regra, esgota o interesse na produção da prova, não havendo sentido na imposição de eventuais medidas coercitivas. 2.2. Por meio do documento ou coisa cuja exibição pediu, a parte quer provar um determinado fato. Se a parte adversária se negar a apresentá-los, e o contexto probatório assim o permitir, reputar-se-á o fato como provado, ou seja, a não exibição levará ao mesmo resultado da exibição, não havendo sentido em se aplicar multa coercitiva. ” [2]
Ainda como sustenta o recorrente, o Tema 705 não teria sofrido qualquer alteração em razão do referido dispositivo legal, que se prestaria a impedir atos contrários à dignidade da justiça e à boa-fé.
O entendimento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais foi diferente: ressaltou que o novo CPC teria autorizado a cominação de astreintes, compreendendo como superados o Tema 705 e a própria Súmula 372/STJ (“Na ação de exibição de documentos, não cabe a aplicação de multa cominatória.”)[3].
Em suas palavras:
“[…]o enunciado da Súmula 372 do Superior Tribunal de Justiça, com a vigência do atual Código de Processo, deixou de ter amparo legal tendo em vista que o parágrafo único do art. 400 desse novo texto normativo prevê que “sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido”. Dessa forma, a presunção de veracidade, também prevista no caput desse dispositivo legal, não impediria, em tese, a adoção, pelo juízo a quo, de outras medidas coercitivas, como a aplicação de multa diária. ”
Aqui temos mais uma coincidência: o Tema 1000 poderá discutir também o destino da Súmula 372 do STJ.
Será uma grande oportunidade para o STJ, ante o aparente conflito entre o art. 400, parágrafo único, o Tema 705 e a Súmula 372, restabelecer a segurança jurídica, como, nas palavras do Ministro Relator Paulo de Tarso Sanseverino, se espera de uma Corte de precedentes.
[1] Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Advogada.
[2] Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo. Coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier… [et. al.]. 2 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2016.
[3] Fl. 237.